domingo, 31 de julho de 2011

Irai-vos e não pequeis

É possível irar e não pecar? Evidente que sim Irai-vos e não pequeis (Efésios 4.26a) é o que está escrito na Bíblia. Mas, para isso, a ira não deve ser transformada em raiva. A raiva quando é alimentada transforma-se em um sentimento perigoso. Uma pessoa equilibrada, amável e bem educada pode irar em determinadas circunstâncias, mas o fato de se irar não será motivo para que se perca o autocontrole. Logo, uma pessoa que não se deixa levar por emoções, mesmo na ira, não perde o domínio de si mesma, ou seja, ela não deixa que a ira se transforme numa fúria incontrolada.

A fúria é a manifestação incontrolada da raiva ou do ódio. O ódio impele a pessoa a desejar o mal ao seu próprio semelhante que também foi criado a imagem de Deus Façamos o homem à nossa imagem, conforme à nossa semelhança (Gênesis 1.26a). Por isso, não devemos deixar que a ira se transforme em raiva. Como podemos ter raiva de alguém que, como nós, também é a obra prima da criação de Deus?

Há dois tipos de ira: ela pode ser justa ou injusta. A minha ira pode ser justa quando alguém calunia meu companheiro de trabalho ou alguém que tenta deturpar a minha fé em Deus. Outro exemplo: quando alguém acusa qualquer pessoa que me é querida através da mentira. Sendo assim, nesses casos, a minha ira será justa. No entanto, esse meu ato de irar não será motivo para que eu passe a odiar a pessoa caluniadora e mentirosa.

Temos na Bíblia vários exemplos de ira justa. Por exemplo, Moisés quando desceu do Monte Sinai irou-se ao encontrar o seu povo envolvido com idolatria adorando um bezerro de ouro E aconteceu que, chegando Moisés ao arraial, e vendo o bezerro e as danças, acendeu-se-lhe o furor (Êxodo 32.19a). O furor de Moisés foi um momento intenso de raiva que o levou a destruir o ídolo construído pelo seu povo: E tomou o bezerro que tinham feito, e queimou-o no fogo, moendo-o até que se tornou em pó (Êxodo 32.20a). A ira de Moisés se justificou porque o seu povo estava insultando o Deus que os livraram da escravidão do Egito. Veja que Deus não repreendeu Moisés em sua ira intensa e momentânea, mesmo quando ele num momento impensável quebrou as tábuas da lei que ele recebera das mãos de Deus Moisés [...] arremessou as tábuas das suas mãos, e quebrou-as ao pé do monte (Êxodo 32.19b).

A ira é injusta quando ela tem origem na inveja. Por exemplo, Caim ficou irado com seu irmão Abel porque Deus não aceitou o seu sacrifício, mas aceitou o sacrifício de seu irmão E aconteceu ao cabo de dias que Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao SENHOR. E Abel também trouxe dos primogênitos das suas ovelhas, e da sua gordura; e atentou o SENHOR para Abel e para a sua oferta. Mas para Caim e para a sua oferta não atentou. E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe o semblante (Gênesis 4.3-5). Caim sentiu-se ofendido quando o sacrifício de Abel foi aceito por Deus. Toda a sua ira voltou-se para seu irmão, ou seja, a sua ira tinha uma origem egoísta. O egoísta não deseja ver seu semelhante ser aceito e nem que ele se prospere.

A ira quando é injusta provoca na pessoa uma transformação visível na forma de agir e pensar. A pessoa irada tem o seu semblante transformado de tal forma que o próprio Deus interrogou Caim E o SENHOR disse a Caim: Por que te iraste? E por que descaiu o teu semblante? (Gênesis 4.6). O que aconteceu com Caim foi que ele deixou-se levar pela ira. Caim alimentou sua ira a tal ponto de transformá-la em ódio. O ódio tem por consequência cegar a mente e a capacidade de raciocínio da pessoa transformando-a num monstro com sentimentos de vingança.

Portanto, o ódio quando alimentado conduz a pessoa a vingança. A vingança é a atitude mais estúpida que um ser humano pode cometer quando se deixa levar pelo ódio. No entanto, a ira é um sentimento que pode ser controlada, não devemos deixar a ira ir além de um dia não se ponha o sol sobre a vossa ira (Efésios 4.26b). Apesar da ira ser um sentimento que podemos ter a qualquer momento no relacionamento com nossos semelhantes, não devemos deixar que esse sentimento vá além de um dia, pois o sentimento de compreensão e amor devem superar os nossos momentos de ira.

Ter momentos de ira, portanto, não é pecado. O que é pecado é permitirmos que essa ira seja transformada em ódio. Uma vez que permitirmos que a ira seja transformada num sentimento de ódio, o ódio leva ao rancor e o rancor não se atenua com o tempo, ao contrário, torna-se num ressentimento profundo que conduz a vingança. A vingança não é atributo do homem pois, O SENHOR é Deus zeloso e vingador; o SENHOR é vingador e cheio de furor; o SENHOR toma vingança contra os seus adversários, e guarda a ira contra os seus inimigos (Naum 1.2). Assim, devemos deixar que o SENHOR destrua os nossos inimigos. Devemos entregar os nossos inimigos nas mãos de Deus porque ele é misericordioso e longânimo dando chance para que os nossos inimigos se arrependam e sejam salvos.

Jamais devemos nos deixar levar pela vingança. A vingança provoca danos irreparáveis e a pessoa que chega ao ponto de ser vingativa é porque ela já está desprovida da capacidade de perdoar. Ela se torna não só inimiga de seu semelhante mas, está em confronto direto com Deus que é a expressão da paz, do amor e do perdão.

Quando uma pessoa se torna vingativa é porque ela deixou se levar pelo rancor. Pessoas assim, só sabem agir com ímpeto provocando violência e em sua mente o que impera é o uso da força bruta, seus atos são contrários ao direito e à justiça. O mal que o nosso semelhante lançou em nossas vidas não deve ser devolvido na mesma medida Não te deixes vencer o mal, mas vence o mal com o bem (Romanos 12.21).

O perdão é uma arma poderosa que aplaca a ira. Em nossos relacionamentos devemos ser compreensíveis e amorosos com os nossos semelhantes Amarás o teu próximo como a ti mesmo (Mateus 22.29). Devemos também ter a capacidade de perdoar para que possamos suportar as pessoas. O ato de perdoar é um mandamento de Deus e não se trata de um sentimento dependente de nossa vontade "Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de entranhas de misericórdia, de benignidade, humildade, mansidão, longanimidade, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos uns aos outros, se algum tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos perdoou, assim fazei vos também" (Colossenses 3.12-13).

É possível irar sem pecar mas, para isso, devemos nos tornar como crianças. Aqui está um dos segredos que o próprio Senhor Jesus disse para entrarmos no céu: nos converter e nos tornamos como crianças E disse[Jesus]: Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos fizerdes como meninos, de modo algum entrareis no reino dos céus (Mateus 18.3). O que Jesus está nos dizendo, dentro do contexto aqui exposto é que a criança ira, mas não guarda rancor. A raiva da criança é passageira e em seu coração pulsa o amor e a compreensão. Quando o sol se põe os pequeninos dormem tranquilos porque em seus corações não há espaço para o rancor e a vingança. Essa tranquilidade é o resultado da capacidade que toda criança tem em perdoar o seu semelhante.

Jesus nos ensina que só há uma condição para recebermos o perdão de Deus "Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós" (Mateus 6.14), mas também nos adverte "Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as vossas ofensas" (Mateus 6.15).  

Celso Novaes.